#007

Don’t judge a book by its Cover

Decidi esta semana mudar a forma como invento estes hebdomadário da quarentena (upside down, boy you turn me) e quero dedica-la ao meu primo escritor-livreiro e rock’n’roller (se fosse também médico e cientista era o Buckaroo Banzai) Francisco Camacho porque foi ele um pouco a minha inspiração. Para esta M4we repesquei a ideia de não julgarmos um livro pela capa (cover em inglês) e dar-vos um fim de semana com 40 versões de músicas que adoro profundamente. Escusado será dizer que terei dentro de uns tempos fazer uma deuxieme partie porque nunca cabe tudo numa só assentada.

No mundo actual cada música que conhecemos é registada como um original pelos seus compositores que depois poderão aprovar a gravação de versões alheias ao original. A ressalva advém do facto de a música popular gravada ter muito pouco tempo de existência se pensarmos que música é coisa que acompanha a Humanidade desde sempre e que por muito tempo só existiu em partituras que podiam ser compradas por quem delas carecia.

Pode ter sido Edison a melhorar a ideia de Alexander Graham Bell, o phonograph trazia algumas ideias inovadoras sobre o graphophone mas não era grande coisa. Seria só dois anos depois, em 1890, que Emile Berliner inventava o gramophone e que a música deixou de ser gravada em cilindros e passou para o actual formato de discos.

Até essa data era algo que a maior parte das pessoas só ouvia se a pudesse tocar ou se tivesse amigos dispostos a darem-lhe… música.

Com o advento da gravação muito mudou e claro apareceram as cover versions dos temas mais populares já que nem toda a gente tem jeito ou vontade para criar originais.

Incluída nesta selecção está o Summertime da ópera Porgy and Bess de Gershwin que em 1935 se tornou logo num standard de jazz tão popular que é reconhecida como uma das canções mais covered na história da música gravada, com mais de 38 mil versões provenientes de grupos e artistas a solo. Gershwin chegou a admitir que a sua composição tinha sido influenciada pela canção de embalar ucraniana Ой ходить сон, коло вікон (Um sonho passa à janela). Ai meu Deus, olha o copyright George.

Mas se na alvorada do século passado tudo parecia bem diferente e a maior parte das pessoas começava a ouvir música através da rádio local, também muitas “versões locais” eram feitas das músicas “do momento”, difundidas por estações que ainda por cima tinham de obedecer às leis de needle time que restringiam o uso de música pre-gravada em deferimento da apresentação das suas próprias orquestras a tocarem as “suas” sindicadas versões das músicas mais notórias.

Constata-se então o facto de que isto não é coisa de agora, que seja uma apatia generalizada em relação ao que é novo e desconhecido, ao render da guarda ali nas sintonias da Smooth ou da M80, que ouvimos com agrado trechos que tem a ver com memórias, umas boas outras nem por isso mas todas parte das nossas histórias.

O sucesso de projectos tão díspares como os Nouvelle Vague (que re-criaram um sub-género de soft cover para os inúmeros sucessos dos 80s) ou de bandas tributo como os americanos Dread Zeppelin ou os australianos Björn Again que tocam repertório de um só artista não deixa dúvidas de que existe uma enorme e sedenta audiência para estas coisas. No caso da Austrália quase que há uma explicação básica: devido a estarem tão longe, os Aussies sempre foram sendo deixados de lado nos planos de touring de muito artista. Por isso e sem grandes pruridos no down under foi-se criando toda uma subcultura de doppelgänging que foi invadindo o resto do mundo. 

Será que a cover aparece pois como um sub-plot para re-contextualizar a nossa primeira impressão sobre a base da qual partiu uma interpretação? Sei só que qualquer versão de uma música deve, logicamente, suscitar reacções ao receptor que conheça de ginjeira a proveniência, um sentido de intenso bewilderement ao ouvir essa versão e o que esta nos diz sobre o que achamos sobre o original.

A escolha de encadear as decima quinta e sexta músicas desta semana é intencional e propositada. Primeiro “Lydia, the Tattooed Lady” escrita por Yip Harburg and Harold Arlen em 1939 para inclusão no filme dos Marx Brothers “At the Circus” que de tal forma se tornou um sucesso para Groucho que este, em 1950 no edifício da bolsa de Nova-Iorque, pegou num microfone, contou umas anedotas e cantou este chorrilho de trocadilhos “parando” durante 15 minutos todas as transacções já que os traders decidiram suspender actividade para poderem ver a sua performance.

Aqui decidi usar a versão interpretada pelo Kermit the Frog dos Muppets, não só porque é brilhante mas porque assim serve como segway para “Sing” que conhecemos cantada por Karen Carpenter mas que foi escrita em 1971 por Joe Raposo para o programa infantil Rua Sésamo e que aqui fica numa rendition por Bing Crosby e Fred Astaire. Este efeito de “pescadinha-de-rabo-na-boca” é pura gasolina se quisermos “apagar o fogo” nesta parada de sucessos em hard e soft cover.  

Só vão deparar com uma repetição, escolhi dois temas do Dylan. Porquê? Porque sim. Podiam ter sido duas músicas do Bowie (com quem começo numa interpretação por Peter Gabriel dos seu disco “Scratch my Back”), ou uma dupla dos Beatles dos quais acabei por escolher só o inacreditável re-arranjo de Maurice White do tema “Got to Get You Into My Life” contida em Revolver, o sétimo album dos Fab Four.

Pelo caminho até escolhi uma interpretaçãode um grande clássico do rock português que fiz há uns anitos em parceria com o Olivier Libaux. Há por isso opção para todo o gosto mas é tudo essencialmente do meu agrado.

E é também por isso que acabo com Les Cornichons, original interpretado por Nino Ferrer e da qual tive para incluir a versão feita pelo grande Thilo Krassman mas à ultima hora decidi mudar para o hilariante El Salchichón dos Un Pingüino En Mi Ascensor, banda espanhola dos 80s formada por José Luis Moro, uma espécie de Manuel João Vieira madrilenho. Ouçam a letra, especial é termo inadequado para classificar este tesouro.

O céu deve-se manifestar descoberto, aproveitem e tenham um original fim de semana.

#staysafe #musicfortheweekend

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I decided this week to change the way I invent these weeklies for social distancing (upside down, boy you turn me) and I want to dedicate it to my cousin writer-bookseller and rock’n’roller (was he also a doctor and scientist he would be Buckaroo Banzai) Francisco Camacho because he was my inspiration. For this M4we, I rehashed the idea of ​​not judging a book by its cover and so bringing you 40 versions of songs that I deeply love. It goes without saying that I will have to make a deuxieme partie in a while because one can never fit all in one go.

In today’s world, every song we know is registered as an original by its composers, who will then be able to approve the recording of versions of said the original. This all stems from the fact that recorded popular music has very little time in existence if we think that music has always been with Humanity and that for a long time it only existed in (hand written and later on printed) scores that could be purchased by those who lacked them.

It may have been Edison who improved Alexander Graham Bell’s idea, the phonograph brought some innovative ideas about the graphophone but it was no big deal. It was only two years later, in 1890, that Emile Berliner invented the gramophone and that music was no longer recorded on cylinders and moved to the current disc format. Music was something until then that most people would only hear if they could play it or if they had musician friends willing not to let him embarrass himself.

With the advent of recording a lot changed and of course cover versions of the most popular themes started sprucing up since not everyone has the ability or desire to create originals.

Included in this selection is Gershwin’s Summertime from the 1935 opera Porgy and Bess, which soon became such a popular jazz standard that it’s recognised as one of the most covered songs in recorded music history, with over 38,000 versions coming from groups and solo artists. Gershwin even admitted that his composition had been influenced by the Ukrainian lullaby Ой ходить сон, коло вікон (A dream passes by the window). Oh my God, watch out for the copyright police George.

At the dawn of the last century everything seemed different with most people starting to listen to music through the local radio, many “local versions” were also made of the songs “of the moment” and broadcast by stations that had to obey the needle time laws that restricted the use of pre-recorded music in accordance with the performance of their own orchestras to play “their” syndicated versions of the most notorious songs.

One can see then that this is not a new thing, maybe there is not any generalised apathy towards what is new and unknown, that we render the guard when tuning any nostalgia radio station only because we are pleased to hear these audio snippets that have to do with memories, some good and other not really but all of these playing some role in our stories.

The success of projects as diverse as Nouvelle Vague (which re-created a sub-genre of soft cover for the countless hits of the 80s) or tribute bands like the American Dread Zeppelin or the Australian Björn Again that play the repertoire of a single artist leaves no doubt that there is a huge and thirsty audience for these things. In the case of Australia, there is almost a basic explanation: due to being so far away, the Aussies have always been left out in many artist’s touring plans. For this reason a whole subculture of doppelgänging was created down under that then spread to the rest of the world.

Does the cover version appears then to us as a sub-plot so to re-contextualize our first impressions about the original? I know only that any version of a song should, of course, provoke reactions to the receiver who knows the source intimately, a sense of intense bewilderment when hearing a version and what that tells us about what we feel about the original.

The choice of chaining this week’s fifteenth and sixth songs is intentional and purposeful. First “Lydia, the Tattooed Lady” written by Yip Harburg and Harold Arlen in 1939 for inclusion in the Marx Brothers’ film “At the Circus” which became such a success for Groucho that in 1950, at the New York’s Stock Exchange building, he grabbed a microphone, told some anecdotes and sang this bagful of puns “stopping” for 15 minutes all transactions since traders decided to suspend activity in order to see his performance.

Here I decided to use the version performed by Kermit the Frog of the Muppets, not only because it is brilliant but because it serves as a segway for “Sing” that we know sung by Karen Carpenter but that was written in 1971 by Joe Raposo for the children’s program Sesame Street and that shows up here on a rendition by Bing Crosby and Fred Astaire. Pure gasoline if we want to “put out the fire” on this hard and soft cover hit chart.

You will only encounter a repetition, I chose two Dylan themes. Why? Because. It could have been two songs by Bowie (with which I start with an interpretation by Peter Gabriel of his album “Scratch my Back”), or a pair from the Beatles songbook from which I ended up choosing only the unbelievable re-arrangement of Maurice White of “Got to Get You Into My Life ”contained originaly in Revolver, the Fab Four’s seventh album.

Along the way, I chose an interpretation of a great Portuguese rock classic  that I did a few years ago in partnership with Olivier Libaux. There is therefore an option for every taste, being essentially every single choice to my liking.

And that’s also why I end up with Les Cornichons, original played by Nino Ferrer and of which I wanted to include the version made by the great Thilo Krassman but at the last minute I decided to switch to the hilarious El Salchichón by Un Pingüino En Mi Ascensor, a Spanish band of 80s formed by José Luis Moro. In case you understand Spanish listen to the lyrics, “special” is an inappropriate term to classify this little treasure.

The sky will manifest itself uncovered, enjoy and try to have an original weekend.

#staysafe #musicfortheweekend

Peter Gabriel – Heroes (Wildebeest Mix)

The Puppini Sisters – We Have All the Time in the World

Yukihiro Takahashi – Volare (Nel Blu Dipinto Di Blu)

The Undisputed Truth – Our Day Will Come

Bryan Ferry –  Knockin’ On Heaven’s Door

Shinehead – Billy Jean

Junior Mance – Let’s Stay Together

Dame Kiri Te Kanawa –  Summertime

The Slits – I Heard It Through the Grapevine

Esther Phillips – Alone Again (Naturally)

Schneider TM –  The Light 3000

Earth, Wind & Fire – Got to Get You Into My Life

Telex – On the Road Again

Silicon Teens – Just Like Eddie

Kermit & Lydia – Lydia The Tattooed Lady

Bing Crosby & Fred Astaire –  Sing

David Bowie – God Only Knows

Bebel Gilberto – Tout est bleu

Senor Coconut – Smooth Operator (Original Radio Edit)

Kimiko Kasai – As

FirstWorld – Groove Is in the Heart

Demon Fuzz – I Put a Spell on You

Rachid Taha – Rock El Casbah

Sid Vicious – My Way

Melt Banana – We Will Rock You

Imelda May – Tainted Love

Montefiori Cocktail – Sunny

Dwight Druick – Georgy Porgy (Version Disco)

Eléctrico chamado Desejo – Sol Da Caparica

Maxayn – You Can’t Always Get What You Want

The String Quartet – Behind The Wheel

The Caterina Valente Singers – Desafinado

Fatboy Slim – Radioactivity

Sérgio Mendes – The Dock of the Bay

Bob James – Feel Like Making Love

The Flying Lizards – Sex Machine

Terry Callier – Just My Imagination

Buddy Holly – Brown Eyed Handsome Man

Kumisolo – Mr. Tambourine Man

Un Pingüino En Mi Ascensor ‎– El Salchichón

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