#041
JSS and other Godlike tech tales
No principio era a palavra. E por isso o canto. E, para marcar o tempo, alguém decidiu esticar uma pele e fazer um tambor. De repente um outro ilustre alguém, que se calhar até tinha uma “voz de cana rachada”, decidiu com um bambu fazer uma flauta.
A história da música popular é todo um percurso de necessidades preenchidas pelo genuíno génio humano. Mas o que fica na poeira do tempo são uns muitos punhados de canções inesquecíveis alicerçadas por vezes em inevitáveis shifts de tecnologia.
O fonógrafo que proporcionou a difusão da música gravada e assim a trouxe para as salas de estar de todo o mundo; a electrificação da guitarra; a gravação multitrack; os efeitos em geral, spring reverb, flanger (sem esquecer o Auto-Tune), etc; o sintetizador e mais tarde o MIDI para lhe dar um canal de comunicação, os samplers, o PC (personal computer) e os DAW. E, para bem ou para mal, o streaming.
O engenho de Edison ainda descambou no clássico Technics SL1200, possivelmente um dos instrumentos mais importantes do século XX se pensarmos no seu papel no hip-hop e outras línguas francas da pop (John Zorn, por exemplo, escreveu uma peça para voz, quarteto de cordas e gira-discos). Todas a outras inovações acima enumeradas são consequências da vontade de melhorar a qualidade e a rapidez de composição, produção, transmissão e armazenamento desta arte criativa.
A invenção da fita magnética fez com que se pudesse não só gravar mas também alterar os resultados prévios, fragmentando, combinando, distorcendo, etc. Ao alterar as velocidades de gravação, por exemplo, um compositor de música concreta poderia assim comprimir uma inteira sinfonia de Beethoven num único segundo ou fazer uma só palavra durar uma hora.
Exemplo: Ring Precis, uma composição de Hal Freedman dos meados dos anos 70. Freedman fez uma gravação das quatro Der Ring des Nibelungen de Wagner, tudo tocado simultaneamente. O som resultante é, sem dúvida, totalmente diferente de tudo até aí ouvido, mas mais interessante ainda são as implicações temporais resultantes do procedimento composicional de Freedman, porque ao comprimir por sobreposição dezoito horas em três minutos criou uma nova peça a partir de umas quantas antigas.
Segundo o teórico musical Walter Everett, quando os Beatles gravaram sua música “Strawberry Fields Forever”, foram feitas duas versões. A original, composta para os Beatles e flautas e gravada no tom de LÁ a um tempo de cerca de 92 bpms. Depois de ouvir o resultado Lennon decidiu que soava ‘muito pesado’, exigiu que fosse re-escrita e que fosse mais rápida. Uma segunda versão, com trompetes e violoncelos, foi gravada na tonalidade de SI bemol a cerca de 102 batidas por minuto. Lennon gostou do início da primeira versão e do final da segunda pedindo ao engenheiro para juntá-las. Quando as velocidades de ambas as fitas foram ajustadas para corresponder ao tom, o tempo de ambas era fortuitamente o mesmo a 96 batidas por minuto. As duas partes foram editadas para uma só e este procedimento deu à prestação vocal de Lennon um timbre meio irreal, especialmente na segunda parte mais lenta da música.
Poderia estar aqui horas a contar histórias de tecnologia que erigiu monumentos à pop music, do Plunderphonics de John Oswald até ás mensagens secretas gravadas em reverse por alguns dos maiores ícones da música contemporânea. Mas a minha predileção é outra e assim escolhi 40 trechos (ficou, para variar, muito por mostrar) de odes aos “deuses tecnológicos” destes tempos modernos em que vivemos. Começo com o profícuo flautista V.D.B. Joel e um Mouse Runner saído do seu disco Colorsound CS 74: Video Games & Data Movements datado de 1987. Passo logo para Prole’gomènes do francês Ludovic Llorca, conhecido como Art of Tones e que aqui nos deixa uma pequena brincadeira sobre os downloads ilegais de música.
Em todas as composições desta m4we existe nitidamente um sentido de urgência em relação à tecnologia e a tudo o que vem acoplado a ela. Seja no sentido lato, citadino e urbano, como em City Life: V. Heavy Smoke, peça de Steve Reich aqui interpretada pela Holst Sinfonietta com Klaus Simon no piano, quer no sentido mais onírico como em Computer Love, aqui numa versão dos Glass Candy que acaba por trazer alguma sensualidade ao clássico dos mensch-maschine de Düsseldorf.
O theremin, homónima invenção que Lev Sergeevich Termen patenteou em 1928, também está aqui incluído na forma menos espectável possível, num Future Sound of Theremin, um reggae de Gaudi com ajuda de Mad Professor, junção improvável no disco 100 Years of Theremin (The Dub Chapter) editado em 2020. Termen teve dois grandes “padrinhos” na divulgação do seu instrumento contactless. Clara Reisenberg Rockmore, prodígio do violino, instrumento que teve de abandonar devido a uma tendinite, tornando-se numa ávida defensora do theremin. E, claro, anos mais tarde, nos 50s um jovem chamado Robert Moog que se iniciou na construção de instrumentos electrónicos ainda nos seus tempos de liceu, escrevendo vários artigos sobre a sua construção e vendendo kits para montagem do instrumento.
Jean-Jacques Perrey, que com alguns Moog mais o famoso Ondioline deixa aqui o belo E.V.A.gravado em 1970 no album Moog Indigo. Perrey, um estudante de medicina qui a échangé le scalpel pour le clavier, continuou mais tarde a desenvolver pesquisa no campo dos sons terapêuticos para a insónia.
Não menos preocupados com as ramificações tech inscritas na escrita pop são as escolhas de Thomas Dolby (até o nome artistico do nado Morgan Robertson adverte para isso) com She Blinded Me with Science e Ever New de Beverly Glenn-Copeland, um admirável músico que voltou à ribalta quando do re-descobrimento em 2010 de um album editado em 1986 e composto com ajuda de dois ícones dos 80s, o Yamaha DX7 e a Roland TR-707. Beverly é o seu nome feminino, a mudança de sexo ainda não era pública quando o jornal The Stranger em Seattle considerou o LP Keyboard Fantasies (de onde fui buscar esta música) um dos 70 discos mais importantes gravados por mulheres.
Deixei de fora no entanto algumas mulheres muito relevantes neste circulo: Wendy Carlos (nascida Walter), Daphne Oram, Suzanne Ciani, Delia Derbyshire, 40 não é numero que dê para tudo, mas é assim a vida… Inclui no entanto a grega tri-repetente nestas andanças Lena Platonos com The Number 9, a menos conhecida Carol Rich com Computered Love, a sueca Fatima Bramme Sey com Technology e mais umas quantas miúdas rijas responsáveis por variadas tipologias musicais, da qual tinha mesmo de escolher a qwerty pop de Stop Space Return na voz de Danielle “Ladydriver” Moore, cantora dos Crazy P (sim, o P é de pénis, mas não é coisa que se anuncie em voz alta nos tempos que correm).
Sem dúvida que é à laia de shape of things to come que acabo a colecção desta semana em beleza com o clássico Life In Tokyo dos meus adorados Japan.
PS: just in case, JSS é uma ferramenta para CSS que permite usar JavaScript para descrever estilos de forma declarativa, livre de conflitos ao mesmo tempo que reutilizável. Pode ser compilado no browser, no lado do servidor ou em tempo real na construção do Node. É agnóstico em termos de estrutura e consiste em vários pacotes: o núcleo, plug-ins, integrações de framework…
const styles = {
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#staysafe #musicfortheweekend
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In the beginning it was the word. Therefore the vocalising of a song. And, to set the tempo, someone decided to stretch a skin and make a drum. Suddenly another illustrious someone, who’s voice might even sound like a “cracked cane”, decided to join “the band” with a flute made out of bamboo.
The history of popular music is a journey of needs fulfilled by the ingenuity of the human genius. But what remains over the dust of time are a handful of unforgettable songs based at times on inevitable shifts in technology.
The phonograph that provided the spread of recorded music and thus brought it around the world into our living rooms; the electrification of the guitar; multitrack recording; effects in general, spring reverb, flanger, (not to mention Auto-Tune) etc; the synthesizer and later on MIDI to give it one more communication channel, samplers, the PC and the DAW. And, for better or worse, streaming.
Edison’s device ended up giving us many years later the classic Technics SL1200, possibly one of the most important instruments of the 20th century considering its role in hip-hop and other products of the pop lingua franca (John Zorn, for example, wrote a piece for voice, quartet of strings and turntable). All other innovations listed above are the result of an acute necessity and desire to improve the quality and speed of composition, production, transmission and storage of this creative art.
The invention of the magnetic tape for example made possible not only recording but also the possibility of alterations of previous results, fragmenting, combining, distorting and so on. By changing recording speeds, for example, a composer of concrete music could thus “compress” an entire Beethoven symphony into a single second or make a single word last an hour.
Example: Ring Precis, a composition by Hal Freedman from the mid-1970s. Freedman made a recording of Wagner’s all four Der Ring des Nibelungen played simultaneously. The resulting sound is, without a doubt, totally different from everything heard until then, but even more interesting are the temporal implications resulting from his compositional procedure, because by compressing eighteen hours into a three minutes piece by means of overlap Freedman created a new piece from a few old ones.
According to musical theorist Walter Everett, when the Beatles recorded their song “Strawberry Fields Forever”, two versions were made. The original, composed for the Beatles and flutes was recorded in the key of A at a tempo of about 92 bpms. After hearing the result Lennon decided that it sounded ‘too heavy’ and demanded for it to be rewritten and that it should be faster. A second version, with trumpets and cellos, was recorded in the key of B-flat at about 102 beats per minute. Lennon enjoyed the beginning of the first version and the end of the second asking the engineer to put them together. When the speeds of both tapes were adjusted to match the pitch, the tempos of both were fortuitously the same at 96 beats per minute. The two portions were edited into one and this procedure gave Lennon’s vocal performance a somewhat unreal timbre, especially in the second slowed-down half of the song.
I could be here for hours telling stories of technologies that built pop monuments, from John Oswald’s Plunderphonics to the secret messages recorded in reverse by some of the royalty of contemporary music. But my preferences go in a different path and so I chose 40 excerpts (leaving much on the side), true odes to the “technological gods” of these modern times in which we live. And so I begin with workaholic flutist V.D.B. Joel and a Mouse Runner out of his Colorsound CS 74: Video Games & Data Movements dated from 1987 and then moved on to Prole’gomènes by Ludovic Llorca, a french messieur known as Art of Tones giving us here a little inside joke about illegal music downloads.
In all the compositions of this week’s m4we there’s a clear sense of urgency in relation to technology and everything that comes attached to it. Be it in the broad, city-ish urban sense, as in City Life: V. Heavy Smoke, Steve Reich’s piece, here performed by the Holst Sinfonietta with Klaus Simon on the piano, or in a more dreamlike sense as in Computer Love, here wrapped up by Glass Candy in a version which ends up bringing some detached sensuality to the Düsseldorf mensch-maschine classic.
The theremin, homonymous invention that Lev Sergeevich Termen patented in 1928, is also included here possibly in the least imaginable way, in Future Sound of Theremin, a reggae by Gaudi with the help of Mad Professor, an unlikely junction on the album 100 Years of Theremin (The Dub Chapter) published in 2020. Termen had two great “godparents” in the promotion of his contactless instrument. Clara Reisenberg Rockmore, a prodigy of the violin, instrument she had to abandon due to tendinitis becoming an avid defender of the theremin. And, of course, years later, in the 50s, a young man named Robert Moog who started building electronic instruments in his high school years, writing several articles about their construction and selling kits for assembling the instrument.
Jean-Jacques Perrey, who with a few Moogs plus the famous Ondioline left us here the beautiful E.V.A. recorded in 1970 on the album Moog Indigo. Perrey, a medical student qui a échangé le scalpel pour le clavier, later continued to develop research in the field of therapeutic sounds for insomniacs.
No less concerned with the tech ramifications inscribed in the art of pop writing are the choices of Thomas Dolby (even the stage name of the musician born Morgan Robertson warns us of this) with She Blinded Me with Science and Ever New by Beverly Glenn-Copeland, an admirable musician who saw himself in the limelight with the 2010’s rediscovery of an album published in 1986 and composed with the help of two icons of the 80s, the Yamaha DX7 and the Roland TR-707. Beverly is his female name, the sex change was not yet public when The Stranger, a newspaper in Seattle considered the LP Keyboard Fantasies (where I got this song from) one of the 70 most important records made by women.
I left out, however, some very relevant women in this circle: Wendy Carlos (born Walter), Daphne Oram, Suzanne Ciani, Delia Derbyshire, 40 is a number that gives not enough room for everything, but this is the way life goes… However, I still included Greek Lena Platonos (three times already has she showed her talents in these weekly selections of mine) with The Number 9, the less known Carol Rich with Computered Love, Swedish born, London based Fatima Bramme Sey with Technology and a few more hardy girls responsible for various musical typologies, from which I had to choose the qwerty pop of Stop Space Return in the voice of Danielle “Ladydriver” Moore, singer of the group Crazy P (yes, the P is for penis, but it is not something that is announced loudly these days).
Undoubtedly it’s a “shape of things to come” kind of decision that makes me end this week’s collection with the classic Life in Tokyo from fan-fave Japan.
PS: just in case, JSS is a CSS tool that allows you to use JavaScript to describe styles in a declarative way, free of conflicts while being reusable. It can be compiled in the browser, on the server side or in real time when building the Node. It is agnostic in terms of structure and consists of several packages: the core, plug-ins, framework integrations…
const styles = {
‘@global’: {
body: {
color: ‘green’
},
a: {
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}
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withTemplates: `
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padding: 10px;
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button: {
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}
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‘@media (min-width: 1024px)’: {
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}
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#staysafe #musicfortheweekend
V.D.B. Joel – Mouse Runner
Art Of Tones – Prole’gomènes
Boards Of Canada – Turquoise Hexagon Sun
Prince – Computer Blue
Jean-Jacques Perrey – E.V.A.
Susy Pintus – Computer
Donald Byrd – Science Funktion
Thomas Dolby – She Blinded Me with Science
Glass Candy – Computer Love
Dai Dai Simba – Modern Telephone
Opolopo – Voltage Controlled Feelings
Holst Sinfonietta & Klaus Simon – Steve Reich’s City Life; V. Heavy Smoke
Crazy P – Stop Space Return
Radio Trip – Computers Singing (Alfomega Mix by Markey Funk)
Popular Computer – Otaku
Heaven 17 – Crushed By the Wheels of Industry (Parts I & II Uninterrupted Single Version)
Artfact – Sex Computer
Kazuko Umino – Waltz of Water and Bubbles (Liquid Kids Original Game Soundtrack)
Raymond Scott – ‘The sound of money being wasted’
Santiago – Bionic Funk
Gaudi – Future Sound of Theremin (feat. Mad Professor)
Fatima – Technology
Nástio Mosquito – Tecnologia do Ancião
Carol Rich – Computered Love
Orchestral Manoeuvres in the Dark – Electricity
Beverly Glenn-Copeland – Ever New
Toni Esposito – L’Eroe Di Plastica
Jaseur Boreal – A quoi reve?
July – The Stamping Machine
T.C. Band – Humanoid Voices
Mike Gill – Inflatable Doll
Sparks – Beat the Clock
The Electronic Circus – Direct Lines
Piero Umiliani – Civiltà lontane
Ultravox – Slow Motion
Brian Eno & David Byrne – Mea Culpa (Edit By Mr. K)
Lena Platonos – The Number 9
The Egg – Number Cruncher
Frank Cornilius – Computer Games
Japan – Life In Tokyo (Extended Remix)